domingo, abril 24, 2016

Sem P's


Em toda a modéstia, não sei o que fazer contigo.
Nem tu comigo.
Nunca o soubemos.
No entanto, estamos bem cientes disso, e é nessa sabedoria que reside a nossa força.

Foi nessa incerteza abissal que o nosso amor nasceu. E cresceu.
Fortaleceu-se com uns abalos intermitentes de vida enquanto entrelaçávamos raízes - foi nos lances mais obscuros que nos soubemos melhor amar.

Nunca fizemos juras de amor — em abono da verdade, nunca verbalizei essa sentença “amo-te”, nem tu necessitaste de me conjugar o verbo amar.
Fizemos um acordo, inconsciente, em nunca nos declararmos um ao outro.
Ao enunciarmos o nosso amor verbalmente, seria restringirmos esse sentimento a um vocábulo, e tanto tu quanto eu, crescemos um no outro sem vínculos.

Ao longo destes nossos anos, tenho sentido o teu amor tocar-me das mais variadas formas.
O som do teu caminhar no soalho da casa silenciosa quando chegas; o teu cheiro, que me inunda as narinas e baila desenfreado com o meu, entre o intervalo físico que medeia as nossas figuras num anteceder de deleite; os teus dedos quando se entrelaçam nos meus ao antevermos um adeus; o teu olhar codificado que só eu sei ler...

Hoje, ao me leres é sinal que já não estou cá.
Não mais te conseguirei tocar o amor como o temos feito.
A morte foi amiga e levou-me antes de ti — a fraqueza que me assiste na tristeza, não a saberia aguentar.

Na falta do meu toque, ficam todas as memórias, como marcas digitais do amor que jamais deixou de existir entre nós.
Etéreo.

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