— A.M.O-T.E!
Tal revelação desorientou-a.
— Não achas demasiado precoce? — retorquiu de sorriso meigo a bailar nos olhos.
O amor espreita, ela contraria, mas ele cala-a, colocando um dedo sobre os lábios dela. Sente o ardor daqueles lábios escalar sob a sua pele. Sem se aperceberem, a distância entre os corpos diminui em proporção inversa ao aumento do prazer, tal como uma balança de braços necessita do contrapeso para se obter a medida exata e pretendida.
O indicador desliza agora pelo queixo, arrastando consigo o lábio inferior.
Um gesto que, inconscientemente, a faz gemer, e conscientemente, o convida ao vôo de um beijo que dissipa a precocidade.
[Correm as cortinas. Delírio na plateia.]
Os acordes duma canção ouvem-se por entre conversas animadas no salão.
José aproxima-se do bar. Pede um whiskey, sem gelo. Olha à volta com olhar treinado, desanima com o que vê, pega no copo, e sai para a varanda.
— Aha! Sabia que te ía encontrar aqui! Sempre o mesmo lobo solitário! — uma palmada nas costas e a voz conhecida fazem-no virar a cabeça.
— Olá Carlos — José sorriu perante a jovialidade do amigo — que achaste da peça?
— Estupenda! Existe magia quando contracenas com ela — continua Carlos, efusivamente, enquanto elogia os detalhes que mais o marcaram.
Entre uma baforada mais longa do cigarro que lhe tolda a visão, semicerra os olhos, vê-a entrar.
Só.
A voz do amigo dissipa-se, e a sua mente é inundada pela presença daquela mulher.
[Há olhares mal cruzados. Há uma ferida por expirar]
— Perdoa-me, Carlos — apressou as palavras enquanto apaga o cigarro, dobrando-o em si mesmo.
Atravessa o salão sopesando os passos em direcção a ela. Agora sem medo nem guião. Os seus papeis: uma incógnita.
Estende-lhe a mão e:
— Dança comigo.
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