Já passava bem da 1:00 da manhã.
O primeiro dia de escola amanhecia dentro de poucas horas.
Estava eu atarefada, de regresso ao redemoinho na preparação dos lanches, quando o balcão da cozinha se transforma numa eficiente linha de montagem:
- clic!... clac!... troc, troc!... zás, pás, trás!
É em momentos destes que entro em profunda reflexão, enquanto os dedos trabalham fervorosamente, a mente divaga, mergulha em poços anteriormente vividos e pasmem-se... dei comigo a pensar em tomates!
Estranhas situações a que somos catapultados pela memória.
Tinha eu uns 18 anos.
Num país estranho.
A primeira vez que permaneci longe de casa por vários meses.
Longe de tudo e todos que nos fornecem aquela suposta aura de seguridade.
Tinha decidido experimentar, juntamente com uma amiga minha, essa aventura de que é ser-se "au-pair".
E foi numa das aulas de inglês que tinhamos semanalmente (uma classe repleta de jovens dos quatro cantos do mundo!), que aprendi a apreciar o verdadeiro sabor do tomate.
Sim... claro que eu já os comia, mas com um molhito por cima que disfarçava em grande parte a textura deste delicioso fruto (Sim! É fruto!).
A professora, nesse dia, pede-nos que nos juntemos a pares (fiquei de "braço dado" com o Alain... um francês castiço que tinha sempre um largo sorriso estampado no rosto) e dá-nos a escolher um entre vários legumes e frutos à disposição.
Muito contra o meu gosto (eu tinha já os meus olhos vidrados num kiwi...), lá nos deparamos com o tomate.
Tinhamos que o analisar... cortá-lo... apreciar as suas entranhas... admirá-lo de cima a baixo atentando em pormenores que nos escapam no dia-a-dia voraz da fome e... escrever sobre ele.
Acreditem. É um exercício por demais benéfico.
Preciosa ginástica mental que nos permite pular do real para o imaginário num abrir e fechar de olhos.
Lembro que nós optamos por descrevê-lo sob forma de prosa:
- vimos um labirinto naquele emaranhado de túneis, imaginamos duendes e fadas que tal!...
Já lá vão tantos anos que os detalhes, para sempre se foram e tenho realmente bastante pena de não ter ficado com um exemplar!
(Naquela altura estava lá eu interessada em ficar com um texto que me fale em tomates! Havia tanto para conhecer! Foram uns dezoito anos muito prolíferos em novas experiências)
O que é encantador são estas associações que passamos uma vida inteira, inconscientemente, a realizar.
Para cada indivíduo que conhecemos ou local que frequentamos haverá sempre um pormenor que lhes ficará permanentemente ligado.
Como que nos quisessemos assegurar que nunca serão esquecidos, talvez... sei lá!
Sempre que vejo um tomate, é automático: revejo mentalmente o Alain!
1 comentário:
É verdade o que dizes. E com o passar dos anos as associações são ainda mais frequentes...
Mal "acomparado" sei de alguém que cada vez que vê morangos se lembra de mim :-)
Beijo grande
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