E das profundezas serenas surge uma alma intranquila.
É só uma questão de olhar por outro prisma: não há contradição.
Uma infância salpicada de personagens caricatos, diferentes da norma; aqueles que ressaltam com cor de arco-íris numa foto a preto e branco. Sim, esses os chamados loucos. Os maluquinhos da aldeia. Aqueles de quem se fugia sem olhar para trás depois de uma pedrada ou de um ou outro dizer mais apimentado. E depois era o espreitar só com um olho na esquina ou por detrás de algum arbusto mais protector a mirar-lhe a face irada - por vezes muito, outras nem tanto.
Havia a «Quininha» que trajava sempre a preceito os modelos mais estravagantes que os nossos tenros olhos jamais tinham visto. Havia também o «Tónio-Tolo» que, por sinal, sinal de nascença, era sobrinho da anterior - quanto a mim o mais «perigoso» de todos. Vi-o um dia esbaforido pela rua fora com uma catana na mão (se fosse hoje teria visto uma faca) cortejando um vizinho. E dizem que trazia as suas poupanças dependuradas por um fio dentro de um saco atado aos seus genitais. Dizem, que eu nunca vi.
Havia mais uns quantos que na minha memória se embaciaram.
Há no entanto um que perdura. O «SeManel-dos-Gatos».
De vulgo-louco, como as gentes gostam de apelidar, nada tinha. Era um duende saído de uma história de encantar. Pequeno, pernas arcadas, escuro de tez e vestimentas escuras e sujas. Andava sempre com um saco atirado para trás das costas como quem vai à feira. Mas dizem que não era bem à feira que ele ía vender o conteúdo do saco, e sim lá para o Porto. Não me recordo agora se algum miau eu alguma vez presenciei na sua passagem, mas consta-se que vivia rodeado de felinos vadios revertidos a amigos. Vezes sem conta, entrava sorrateiro na loja dos meus avós, já noite adentro, fora de horas - se bem que a hora de fechar a loja fosse minutos antes da deita - e eu, ainda mais pequena que ele, lá o fitava a custo, sem lhe ter medo algum, do lado oposto do balcão e ouvia-o pedir o costume de todas as noites, Eram umas belinhas, SeJacinto.
Nunca aquele homem se deve ter apercebido da imensa luz que trazia naquele olhar pisqueiro e no seu sorriso genuíno desdentado. Olhar esse que ainda hoje se propaga na mente de certa criança.
Rangia de dor.
Presa naquele colete de forças transparente, gélido.
O vento pedia-lhe, Dá-me só mais uma dança, e ela, perplexa, não se negava mas chorava. Chorava de pesar naquela prisão em que lhe tinham trancado os membros. Esses que um dia, lá no passado de muitas luas, e no futuro longínquo que lhe sorri por detrás das folhas, foram livres de o enlaçar e com ele dançar.
"4.5 billion years ago, the Earth was born. Comprehending that vastness in time is no easy task.
John McPhee, in his book Basin and Range, recounts a nice illustration of what this sort of time means. Stand with your arms held out to each side and let the extent of the earth's history be represented by the distance from the tips of your fingers on your left hand to the tips of the fingers on your right. Now, if someone were to run a file across the fingernail of your right middle finger, then the time that humans have been on the earth would be erased."
E eu que uso as unhas sempre rentes.